segunda-feira, 23 de maio de 2011

Cidade diferenciada

GILBERTO DIMENSTEIN

UMA EXPERIÊNCIA lançada neste ano entre universitários da cidade de São Paulo, batizada de Campus Aberto, está testando um jeito de economizar dinheiro com o táxi. Cada corrida pode sair até 70% mais barato. A ideia, muito simples, só é viável por causa das novas tecnologias da informação.
Em mapas publicados na internet, as pessoas registram seu trajeto diário para a universidade e descobrem quem mora perto. Combinam, então, de se encontrar num ponto de táxi. Simples assim. E sem nenhum risco à segurança.
Dependendo da distância que se percorra diariamente, é melhor negócio não ter carro e só pegar táxi, como demonstrou um professor da Fundação Getulio Vargas em reportagem da Folha na semana passada. Rachar o custo da corrida, então, faria essa conta ainda mais favorável, estimulando o cidadão a deixar o veículo na garagem.
Começa nesta semana uma campanha publicitária estimulada pela SOS Mata Atlântica para tentar reduzir o número de carros na cidade de São Paulo, quando serão apresentados meios de compartilhar o automóvel; o projeto criado para os universitários é um deles.
Esse tipo de ideia pega no Brasil?


Essa questão será discutida em um encontro, no final do mês no Brasil, entre prefeitos das 40 maiores cidades do mundo. Serão gestadas ali soluções para preservar o planeta.
Os automóveis são fonte permanente de problemas na locomoção dos indivíduos e favorecem o aquecimento global. Há uma criatividade planetária empenhada em domesticá-los. Em algumas cidades, estão implantando medidas mais radicais, como o pedágio urbano.
Espalha-se pelo mundo o projeto de compartilhamento de bicicletas, depois da visibilidade que ganhou em Paris e de chegar a Nova York. No Brasil, o teste está sendo feito no campus da USP.


Em Londres, há um movimento para estimular os vizinhos a emprestar seus carros. No final, o custo fica mais baixo que o de uma corrida de táxi. O único inconveniente seria a dificuldade de compartilhar a chave, problema que foi resolvido em San Francisco, nos Estados Unidos, o mais efervescente centro mundial de inovação em tecnologia da informação, onde desenvolveram um sistema que permite abrir e acionar o carro pelo celular.


Quando um empreendedor decidiu criar, nos Estados Unidos, uma empresa (ZipCar) para alugar carros por hora, foi chamado de maluco. Ele percebeu que muita gente preferia não ter um automóvel. A "maluquice" entrou na Bolsa de Valores, arrecadou, no mês passado, R$ 250 milhões e está obrigando as empresas tradicionais de aluguel de veículos a se reciclarem.


Uma das áreas que mais atraem ideias ousadas é a de produção de carros menores que não poluam. É uma tremenda diversão visitar laboratórios de universidades americanas e ver os garotos tentando inventar o carro do futuro. Em alguns deles, o motor fica na roda.
Uma das boas cenas que presenciei aqui em Harvard foi a apresentação de Jaime Lerner, num seminário sobre urbanismo e inovação, em que mostrou seu projeto do "menor carro do mundo", movido a energia solar -um carro pensado para ser compartilhado e facilitar o trânsito, não para uso particular. Foi uma comoção geral, em meio a aplausos.


Há uma sensação de que, em lugares como São Paulo, estamos próximos de um colapso. A informação está cada vez mais veloz, e o trânsito, mais lento e ameaçador à saúde. Na semana passada, a USP divulgou estatística de que, apenas na cidade de São Paulo, a poluição mata 4.000 pessoas por ano -mais do que a Aids e a tuberculose juntas.


Esse é o pano de fundo da polêmica em torno da estação Higienópolis do metrô, recusada por alguns moradores do bairro para afastar "gente diferenciada". A frase ajudou a fazer a combustão, mas foi só um detalhe. No passado, bairros ricos de São Paulo já recusaram o metrô por causa dos "diferenciados". Ganharam e não houve tanta repercussão.


O essencial é o crescente consenso de que, numa cidade diferenciada -isso significa civilizada-, os carros são domesticados e os pedestres têm prazer de andar nas ruas.

Folha de São Paulo

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