quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Congestionamentos: pedágio, estacionamentos e o resgate dos espaços públicos

Com o advento da Lei 12.587, que institui a Política Nacional da Mobilidade Urbana, a via não é mais do automóvel. A lei é clara ao dizer que essa prioridade terminou a partir de 12 de abril deste ano. A rua deve, primeiro, ser ocupada pelo transporte não motorizado (pedestres, bicicletas e assemelhados), depois, pelo transporte público e, finalmente, pelo automóvel. O artigo é de Nazareno Stanislau Affonso.

 
Em todas as cidades do mundo onde foi implantado o Pedágio Urbano foi constatado que esse mecanismo reduz o congestionamento e a poluição atmosférica. Portanto é falso afirmar que é uma proposta que não dará resultados positivos na redução dos congestionamentos.

Contraditoriamente ao que se defende na classe média, o pedágio traz compensações para a população de menor renda: primeiramente, porque libera o sistema viário e, com isso, aumenta a velocidade dos ônibus, reduzindo custos (menos ônibus fazem o mesmo serviço); depois, porque produz recursos para melhorar a qualidade do transporte coletivo, construir ciclovias e ampliar e qualificar as calçadas – logo, melhora a situação de mais de 70% das viagens, prejudicando em parte as 30% restantes feitas em automóveis privados. Portanto é falso afirmar que se está prejudicando os mais pobres só porque parte deles adquiriu o seu primeiro carro – que pode ser usado para le var o filho à escola, um doente ao hospital, visitar a família e fazer viagens.

O Pedágio Urbano é viável tecnicamente, incentiva o uso do transporte público e melhora de imediato sua operação por estar livre dos congestionamentos, além de trazer, como vivi em Londres, as bicicletas para compartilhar com segurança vias que antes eram privatizadas pelos automóveis.

É necessário desfazer argumentos contrários ao Pedágio Urbano e à Lei de Mobilidade. Com o advento da Lei 12.587, que institui a Política Nacional da Mobilidade Urbana, a via não é mais do automóvel. A lei é clara ao dizer que essa prioridade terminou a partir de 12 de abril deste ano. A rua deve, primeiro, ser ocupada pelo transporte não motorizado (pedestres, bicicletas e assemelhados), depois, pelo transporte público e, finalmente, pelo automóvel. Ao automóvel são reservados 30%, em média, das vias. Os demais 70% são para as bicicletas, calçadas e transporte público.

Logo, é urgente que o poder público democratize o uso das vias existentes, começando pelas novas vias ou alargando outras, das quais devem ser reservados 70% para os modais não motorizados e o público. A lei veta, por exemplo, que os governos implantem um novo viaduto ou via expressa reservada somente para carros ou, como é comum, construam ruas ou avenidas sem espaço para a circulação de bicicleta e com calçadas estreitas para o volume de pedestres.

É importante afirmar que já existe pedágio urbano em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, só que gerido integralmente pela iniciativa privada. São os estacionamentos, que cobram o que o mercado exige sem que haja uma grita geral e algum controle público. Aliás, a grita geral é contra os flanelinhas, que são os que menos lucram com esse negócio altamente rentável e que não traz retorno algum para o poder público.

O Fórum Nacional da Reforma Urbana (FNRU), o Movi mento Nacional pela Direito ao Transporte (MDT) e o Ruaviva - Instituto da Mobilidade Sustentável vêm lançando há três anos consecutivamente a proposta “a rua é das pessoas e não dos carros” durante as Jornadas Brasileiras “na cidade, sem meu carro”. Nela, defendem a fluidez do transporte coletivo, bicicletas e pedestres e a proibição do estacionamento na via pública em áreas de corredores de transportes coletivos e centrais da cidade, restituindo-se assim a democracia do espaço público ao usar as áreas de estacionamentos para ampliar calçadas, implantar ciclovias ou ciclo-faixas para bicicletas e as vias privativas para o transporte público. Portanto, a proposta é o fim do mercado privado dos estacionamentos, para que estes passem para o controle da gestão pública, que concederia esse serviço e o licitaria pelo maior preço, valor que seria repassado a um fundo de transporte público e não motorizado – como determina a nova Lei de Mobilidade.

As entidades defendem ainda a inclusão dos automóveis de forma democrática no sistema estrutural de transportes públicos (metrô, ferrovia urbana, corredores exclusivos de ônibus-BRT e BRS, Veículos Leves sobre Trilhos-VLT e, inclusive, monotrilhos) através do incentivo à implantação de grandes garagens junto às estações desses sistemas. Todas essas propostas seguem as orientações da Lei de Mobilidade Urbana em vigor desde 12 de abril de 2012.

O Pedágio Urbano democratiza a mobilidade onde é implantado? Diria que sim, principalmente em cidades onde há uma crise ampla e geral de circulação – cujo caso exemplar é São Paulo. Cidade que chama urgentemente a intervenção pública. Primeiramente, para cumprir as promessas do governo do estado de investir R$ 45 bilhões em sistemas estruturais de transportes públicos sobre trilhos. Depois, para pressionar o novo governo municipal a democratizar a via privatizada pelos automóveis cria ndo BRS (vias exclusivas monitoradas contra invasão de automóveis) no maior número de vias em que circulam ônibus, retirando-os dos congestionamentos dos carros e, com isso, aumentando a velocidade e, consequentemente, reduzindo custos – como no Rio de Janeiro, onde houve redução de 23%.

Ao enfocar a democratização do espaço público, a Lei de Mobilidade coloca nas mãos de nossas autoridades o grande desafio de enfrentar o senso comum que tem servido para tornar a apropriação privada pelos automóveis uma política de Estado. Falar de automóvel é discutir privilégios nas políticas públicas. Falar de transporte público e não motorizado é discutir como promover direitos.

(*) Urbanista, presidente do Ruaviva - Instituto da Mobilidade Sustentável, coordenador do Movimento pelo Direito ao Transporte (MDT) e coordenador da Associação Nacional de Transporte Público (ANTP) Brasília.

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