A principal questão discutida foi sobre os acidentes de trânsito. Nazareno enfatizou que esse tipo de violência social precisa acabar. Mostrou a todos que as ocorrências de trânsito refletem um conjunto de fatores estruturais da realidade social, a começar pela prioridade concedida aos automóveis nas vias públicas. “A violência no trânsito é um fenômeno cujas causas são determinadas socialmente e suas consequências são dramáticas para vida das pessoas” frisou, acrescentando que os números dão uma noção da extensão da tragédia em que se transformou o trânsito no País. “Basta verificar que, anualmente, são registrados 1,5 milhão de acidentes, com o envolvimento de 7,5 milhões de pessoas, das quais 400 mil ficam feridas – uma parte considerável dessas com sequelas irreversíveis. E o que é extremamente grave é que cerca de 35 mil pessoas morrem.
De acordo com o dirigente do MDT, para erradicar a violência no trânsito, é preciso uma mudança cultural. “Precisamos democratizar o uso do espaço urbano, mas isso exige das autoridades uma nova postura, uma atitude mais firme em defesa da vida e do meio ambiente. O trânsito seguro é um direito do cidadão e um dever do estado, portanto, a segurança no trânsito deve ser consubstanciada em uma política pública efetiva, definida e implementada sob responsabilidade dos municípios, dos estados e da União”.
Travessia segura. Nazareno Affonso comentou o projeto que o Consórcio do Grande ABC propôs para as sete cidades que compõem a região do ABC – além de São Caetano do Sul, também Santo André, São Bernardo do Campo, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra – e cujo objetivo e garantir o respeito à faixa de pedestre.
“As sociedades que conseguem respeitar a faixa de travessia terão dado um considerável salto de qualidade no tocante à proteção à vida no trânsito. Nesse processo, o poder público não pode e não deve se ater meramente à administração cotidiana dos fatos, mas, ousar, alçando-se ao conceito estratégico de administrar fenômenos, de mudar mentalidades, de mudar coletivamente o comportamento das pessoas”, afirmou, assinalando: “Conseguir o respeito ao pedestre na faixa é, portanto, adquirir um novo status de cidadania”. Em seguida, mostrou como foi implantado em Brasília o respeito à faixa de travessia, durante sua gestão como secretário de Transportes do Distrito Federal, no final dos anos 80.
Crianças em movimento. A Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana de São Caetano do Sul manifestou o interesse em criar um espaço voltado a crianças em idade escolar. A respeito disso, o consultor e coordenador do MDT discorreu sobre como incentivar e estimular a discussão dos conceitos de mobilidade urbana com os públicos infantil e juvenil. Nazareno Affonso assinalou que a questão principal é buscar um modo de levar o crianças e jovens a entender, de forma prática, quais são as diversas formas do “ir e vir” em uma cidade, num processo que associe conceitos como inclusão social, sustentabilidade e ética. Ele salientou a importância de a proposta envolver não apenas a criação de espaços, mas associá-los com ações educacionais, para a apresentação dos conteúdos nas escolas, com a formação de docentes, distribuição de material informativo e, ainda, com diversas outras ações complementares, descritas na sessão.
O primeiro momento proposto diz respeito à construção de uma cidade cenográfica, na qual as crianças vivenciarão, de forma prática e lúdica, as diversas questões relacionadas às políticas de mobilidade urbana e também às ações responsáveis adotadas por cada indivíduo. Percorrendo as escolas e com o intuito de potencializar os conhecimentos aprendidos na visita à cidade cenográfica e nas ações de formação, a proposta inclui ainda a criação do Ônibus da Mobilidade, exposição interativa em um espaço multimídia. O objetivo é apresentar para crianças e jovens ações e conceitos relativos à mobilidade urbana, de maneira lúdica, divertida.
O Ônibus da Mobilidade apresentará nas escolas diversas técnicas de comunicação e imersão, as quais permitirão aos visitantes vivenciarem uma experiência que integrará elementos virtuais e reais, na apresentação de animações, filmes, teatro e jogos. O veículo proporá aos participantes uma série de problemas e desafios, de modo que possam montar uma solução criativa e sustentável sobre o tema da mobilidade urbana. Com uma maior compreensão e familiaridade sobre esses temas, os participantes terão novos elementos para entender a importância dessa área de estudo, contribuindo para desenvolver sua capacidade de debater e pensar criticamente sobre as formas de se deslocar dentro da cidade.
Para ampliar o acesso de toda a comunidade na discussão sobre mobilidade urbana, o projeto discutido inclui ainda a possibilidade de expansão dessas atividades já delineadas para parques municipais indicados pela Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana de São Caetano do Sul. A intenção é que experiências semelhantes às da cidade cenográfica sejam ampliadas e adaptadas para o público em geral, especificamente nesses parques, de modo que os visitantes possam compreender conteúdos relacionados à mobilidade urbana de forma prática. As experiências serão montadas em espaço abertos e serão auto-explicativas, ou seja, terão instruções para uso e informações para que o visitante entenda qual é o objetivo daquela atividade. Com isso o projeto propõe incentivar as discussões sobre a mobilidade para toda a população.
Dia sem Carro. Na parte final de sua exposição, Nazareno Affonso mostrou a importância de haver um questionamento a respeito das consequências para o País e para a sociedade, de um modelo de mobilidade centrada automóvel. Ele disse que o automóvel tem sorvido muito dinheiro público. As montadoras têm facilidade de acesso a créditos e sabem como aproveitar ocasiões como a crise global de 2008 e 2009 para convencer o governo a ceder estímulos à compra de veículos baseados em renúncia fiscal. Os governos também promovem isenções de impostos federais e estaduais para atraírem montadoras, de modo a gerarem empregos e arrecadação, mas se ‘esquecem’ de que a presença crescente de automóveis e motos nas cidades e estradas, propiciam as diversas ‘externalidades negativas’ – congestionamento e ineficiência urbana, poluição, ocorrências no trânsito com milhares de mortos e feridos por ano, entre outras – , que geram custos e dor para a sociedade e amplias as despesas das administrações públicas e instituições privadas. Por outro lado, institucionalizou-se no País o chamado ‘carro popular’, largamente vendido por meio de facilidades de crédito ao consumidor.
Segundo o coordenador do MDT, obviamente, não seria possível, num passe de mágica, eliminar automóveis e motos das cidades. Mas ele chamou a atenção para a existência da Jornada Brasileira ‘Na Cidade, Sem Meu Carro’ ou o Dia Mundial Sem Carro, sempre em 22 de setembro – uma iniciativa originária da União Européia e que ‘contaminou’ o mundo e também o Brasil, desde o ano 2000. Com esse evento, se procura envolver a sociedade e a mídia, a partir dos governos municipais, e mostrar a perfeita possibilidade de haver vida sem abuso do uso dos veículos particulares motorizados. “Essas jornadas também procuram salientar a importância de haver consistentes investimentos de recursos em transporte público, em infraestrutura para o transporte não motorizado e para garantir a ampla acessibilidade de pedestres e de pessoas com necessidades especiais em seus deslocamentos – sinônimos eloquentes de respeito à cidadania”, concluiu Nazareno Affonso.
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