quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Planejamento urbano no século 21.


Uma entrevista com o renomado arquiteto e urbanista alemão Albert Speer, sobre sustentabilidade, megalópoles e lugarejos abandonados

Sr. Speer, em meados da década de 1980, o senhor foi um dos primeiros a abordar o tema da sustentabilidade no planejamento urbano. Como o senhor chegou a isto? E o que significa a sustentabilidade no planejamento urbano?

Na época, refletimos sobre o futuro das cidades e olhamos também para a história. Com isto, verificamos uma diferença. Hoje temos em todo o mundo todos os materiais à disposição. Antigamente, porém, só se podia construir com os materiais existentes. Não se construíam casas de enxaimel, porque elas são tão bonitas, mas sim porque não havia, além de madeira e barro, nenhum outro material. Aplicamos isto ao desenvolvimento urbano e chegamos assim à ideia de propagar o tema da sustentabilidade. Sustentabilidade significa usar comedidamente os recursos existentes.

Qual é a importância das cidades e, assim, do desenvolvimento urbano no século 21?

As cidades contribuem de forma considerável para a mudança do clima. 80% de todas as emissões provêm das cidades. Com isto, o planejamento urbano é ponto central do desenvolvimento global.

O que deve ser feito?

Nas cidades europeias, as edificações não condizem com a proteção do clima e não correspondem aos critérios da eficiência energética. 90% de todas as construções na Alemanha foram feitas antes do período 1980/1985. Ainda não se falava deste tema. Entretanto existe um programa do governo federal para a modernização dos imóveis. Mas é preciso aumentar decididamente a sua velocidade.

E o que ocorre com o trânsito?

Nas cidades europeias, tentamos interligar todas as funções, de maneira a que possam ser acessadas plenamente a pé. Um belo exemplo disto é o centro da cidade de Colônia, para o qual elaboramos ano atrasado um grande plano diretor. Ele fez com que moradias, trabalho, cultura e lazer ficassem entrelaçados de maneira ainda mais estreita. E com isto, naturalmente, muito menos trânsito é gerado.

Ao contrário das cidades europeias, as megalópoles na Ásia crescem rapidamente. Como é o seu trabalho lá?

Nos 25 anos passados, o desenvolvimento urbano sustentável obteve aceitação em todo o mundo. Nos últimos dez anos, por exemplo, mudou radicalmente a opinião do setor político sobre este tema, também na China. Isto não significa que o desenvolvimento urbano sustentável já esteja sendo praticado em todas as cidades da China. Isto tampouco pode ser espe rado desse país gigantesco. Mas já existem as leis para isto e elas começam a ser implantadas em muitas cidades. Nós trabalhamos, por exemplo, em vários grandes projetos de ampliação urbana em Changchun, no Norte da China. Os responsáveis locais fazem grande esforço para por em prática os princípios sustentáveis.

No centro do interesse público esteve recentemente a inauguração do Burj Dubai, em vez da sustentabilidade. O que o senhor acha do desenvolvimento urbano no estilo de Dubai?

Este desenvolvimento tem dois lados. Por um lado, Dubai logrou, nos últimos anos, estabelecer-se no mapa-múndi como lugar de grandes eventos e de turismo, criando para si uma excelente imagem – em parte, também através de uma arquitetura extraordinária. Este grande hotel, esta vela na praia, maravilhoso. Também o Burj Dubai é um sinal para o futuro de Dubai. Não tenho dúvidas quanto ao seu êxito. O problema é outro. Em primeiro lugar, os edifícios que vão além da marca de 300 até 350 metros de altura não podem ser construídos economicamente, nem operados de maneira econômica. Em segundo lugar, Dubai exagerou no desenvolvimento urbano. Eu só teria construído a metade.

Que cidade se aproxima então das suas concepções de sustentabilidade?

Na Europa, é Barcelona. A cidade aproxima-se muito do conceito de sustentabilidade. Ela é densa, mesclada. O porto foi reutilizado em grande parte, a orla marítima voltou a ser parte da cidade. Barcelona cuida de forma exemplar das construções antigas. Olhando mais adiante no mundo, então é Cingapura. A cidade tinha desde o início o problema de não possuir espaço suficiente, mas tratou disto de forma muito razoável. Isto levou a uma elevada densidade. Mas, dentro desta densidade, surgiu também uma alta qualidade arqui­tetônica. Por exemplo, com edifícios residenciais. Apesar disto, tem-se hoje a sensação de que Cingapura é uma cidade verde.

E na Alemanha?

Hamburgo faz uma política muito inteligente de desenvolvimento urbano, também no sentido da sustentabilidade. Isto não vale apenas para o bairro portuário. Vale também para muitos outros setores.

Os lugarejos e regiões abandonados são o outro lado da moeda das cidades crescentes. Como o senhor trata disto no planejamento?

Uma boa pergunta. Nem os planejadores, nem os políticos estão realmente preparados para este problema. Não se aprendeu isto durante os estudos, nem nunca se foi confrontado com o problema. Até agora, o crescimento sempre foi o ponto central. Mas nós sabemos que em outros países da Europa já é assim há mais de cem anos – por exemplo, no Leste da França ou no Norte da Inglaterra. No futuro, haverá regiões que não poderão mais ser mantidas com o padrão que temos hoje, pois a população migrou e a infraestrutura não pode mais ser preservada com as poucas pessoas que restaram. Nos próximos anos, teremos de ocupar-nos intensivamente com este tema.

Como poderia ser então uma solução?

Eu creio que, no futuro, teremos na Alemanha condições diversas de vida, até mesmo condições de renda e possibilidades de abastecimento. E que a igualdade de padrão de vida em todas as regiões, garantida pela Lei Fundamental, não poderá ser mantida. Paralelamente a esta evolução, observamos uma diferenciação muito forte e uma individualização da sociedade. Existem com certeza pessoas, que dizem, não necessito de nada disso. Adoro viver numa dessas regiões. Não tenho um supermercado perto de casa, mas, em compensação, planto a minha própria horta.

O lema da Expo 2010, em Xangai, é “Better City, Better Life”. O que o senhor espera da Expo? O senhor vai visitá-la?

Nós participamos da elaboração do conceito básico e já havíamos concebido a Exposição Mundial de 2000, em Hanôver. Os organizadores aprenderam muito com isto – por exemplo, a ideia de promover a Expo numa antiga área industrial às margens do rio e não, como se pensara inicialmente, num terreno baldio. É preciso aproveitar a exposição mundial para desenvolver a cidade de forma sustentável. Eu creio que será uma exposição mundial muito impressionante, com um pavilhão alemão muito bonito. Naturalmente, estarei em Xangai para ver isto.

Que projetos o senhor tem ainda em andamento?

No Cairo, planejamos uma medida de ampliação urbana para dois milhões de habitantes e em Alexandria preparamos a candidatura para os “Mediterranean Games” 2017. Além disto, estamos elaborando o plano diretor para a candidatura de Munique aos Jogos Olímpicos de Inverno de 2018 e estamos envolvidos, de maneira substancial, na candidatura do Qatar para a Copa Mundial de Futebol de 2022.


Fonte: Revista Deutschlnd | Jeremy Gaines e Martin Orth

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