O
transporte nas grandes cidades brasileiras, neste início de século, está
marcado pela predominância do uso do automóvel sobre outros modos de
transporte. É uma tendência que se agrava como consequência da
despercebida política de fazermos do automóvel a forma prioritária da
circulação nas cidades. De fato, fomos do bonde para o ônibus e deste
para os carros, movimento de substituição que ainda não encontrou o seu
limite. Porém, se toda a população de uma cidade pudesse ter e usasse
seu automóvel nas viagens diárias, o espaço urbano dedicado às vias,
viadutos, estacionamentos, oficinas, postos, lojas e depósitos seria
maior que o território normalmente ocupado pela cidade. Trata-se,
portanto, de uma impossibilidade física. Se bem que algo parecido já foi
tentado empiricamente em cidades norte-americanas, mas falam agora em
gestão da demanda, retorno ao centro e revitalização dos transportes
públicos.
Teremos
no Brasil que percorrer o mesmo caminho para aprender a lição? Pelo
ânimo dos atuais e potenciais donos de automóveis, caminhamos para o
mesmo impasse. Há uma crença difusa de que é dever dos governantes
encontrar meios e jeitos para que mais carros possam trafegar. Quem tem
discernimento para ver e julgar as formas que já foram tentadas percebe
que não há mais soluções evidentes exceto a dos transportes públicos.
Como
muitos automóveis foram comprados, espero que seus donos não
ressuscitem a conclusão de que agentes de trânsito provocam
congestionamentos, posto que são sempre vistos onde há problemas. Ou que
existe uma indústria de multas prejudicando inocentes infratores. Essa é
uma das mais persistentes “lendas urbanas” como as afirmações de que
ler em ônibus em movimento provoca descolamento da retina, comer abacate
aumenta o colesterol e que entrar em um carro se está quase no
paraíso...
Estamos
em um ano eleitoral e o tema do congestionamento está na pauta de
discussões. Mas, nenhum político imagina que possa ser eleito propondo
medidas de restrição ao uso de automóveis. Contrariando essa posição, um
grupo de técnicos defende uma nova solução: o pedágio urbano.
Argumentam que aqueles que provocam sobrecarga de um bem público devem
pagar pelo seu uso. E, como já não é mais aceitável tarifar o trânsito
através do combustível, por causa da explosão dos preços do petróleo, a
solução é o pedágio urbano, medida pioneira em Cingapura, sucesso em
Londres e última moda em Estocolmo. Qual exemplo serviria para nós? O
pedágio urbano pode ser cobrado pela entrada em um perímetro, pela
circulação em uma área definida ou pelo acesso a uma via, como existe em
Nova York.
No
caso de Londres, onde o pedágio era cogitado desde a década de 1960,
muitas outras medidas foram adotadas antes da sua implantação em 2003,
ter sido incluído na plataforma de Ken Livingstone, prefeito eleito no
ano 2000. Os problemas que eram temidos não ocorreram, mas foram
surpresas: a receita, menor que a esperada, e o custo de operação, o
dobro do estimado.
Como
seria um pedágio paulistano? Cobrança no perímetro do centro expandido?
Cobrança pelo acesso à Avenida 23 de Maio ou pelo tráfego de passagem
nas marginais? Ou cobrança para circular na Vila Olímpia, cuja área do
sistema viário é inferior à demanda gerada pelo “boom” imobiliário?
Para
pensar a respeito será necessário lembrar o que já foi feito em São
Paulo, e até esquecido, como as ruas de pedestre do prefeito Olavo
Setúbal e o escalonamento de horários da prefeita Luiza Erundina. Será
necessário dar continuidade à adoção de técnicas de gestão da
circulação, como o rodízio de placas, horário para a circulação de
cargas e a implantação dos corredores de ônibus realizada nas últimas
décadas. Reconhecer que adotar o pedágio urbano, isoladamente, não é
solução, e que devem ser consideradas também outras medidas de Gestão da
Demanda, já mencionadas nos planos metropolitanos de transporte e
avaliadas em estudo preliminar do Banco Mundial com a Prefeitura de São
Paulo.
Antes de cogitar o "assalto urbano", deve-se primeiro investir pesadamente em transporte de massa decente. É muito fácil cobrar e não oferecer uma ou várias opções.
ResponderExcluirCriar um pedágio urbano simplesmente rouba mais um direito do cidadão e exime dos governantes sua parcela de responsabilidade (afinal, eles são pagos para ter ideias e resolver problemas coletivos!). Diante do caos das ruas controladas pelas prefeituras, de rotas mal planejadas pelos engenheiros de trânsito, da insegurança em circular a pé (criminosos de todos os tipos soltos pelas ruas), do preço absurdo dos táxis e do horrível serviço oferecido pelas empresas concessionárias de transportes coletivos, uma significativa parcela dos motoristas simplesmente decidirá por pagar o tal pedágio, mantendo-se inalterados o problema do trânsito e o da poluição.
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