segunda-feira, 17 de agosto de 2009

A comunicação deveria fazer parte da estratégia de sustentabilidade da indústria automobilística


Metade da população mundial está concentrada nos centros urbanos que crescem 2,5% ao ano o que não deixa dúvidas que o destino da humanidade depende do que acontece nas cidades.

Representando apenas 2% da superfície do planeta, as cidades concentram pessoas, aglutinam problemas, pesadelos, sonhos e soluções dentro de uma frenética rede de relações sócio-econômicas, culturais, políticas, estabelecendo uma grande troca de conhecimento, inteligência, informação e sentimentos. Essa grande união de pessoas e as inter relações dentro de um determinado espaço exige de imediato que se faça o equilíbrio entre o homem e a natureza.

O Brasil parece estar na contramão da tendência mundial entupindo suas cidades com carros enquanto O restante do mundo desenvolvido está investindo em transporte público urbano de massa. É visivelmente grave a situação Na Região Metropolitana de São Paulo onde vivem 19 milhões de pessoas, com cerca de 1000 carros novos em circulação a cada dia e oferta de financiamento em até 60 meses o que contribue ainda mais para os congestionamentos na cidade com aumento da poluição e dos acidentes de trânsito . E assim a vida urbana vem perdendo qualidade.

Os dirigentes devem ter vontade política para carregar a bandeira de um transporte público com qualidade também ser um gestor urbano sério e competente que busque organizar o uso dos espaços urbanos em prol da qualidade de vida da população. A cidade necessita de um serviço de transporte coletivo em toda a sua extensão. A periferia também deve ser atendida com o mesmo padrão de transporte público existente nos centros urbanos mais ricos o que também significa que a cidade deverá ser desenhada para facilitar a vida de pedestres, ciclistas e usuários de transporte público.

O maior desafio hoje é fazer a cidade acreditar em si mesma, em sua força. Não pode haver divergências entre política e sustentabilidade. Com interesses específicos e visão limitada ao aqui e agora, as decisões na esfera do poder não podem deixar de cumprir os princípios do bem comum e universal. Enquanto o cidadão não se der conta da sua força e importância capazes de provocar as mudanças necessárias e traçar o próprio destino nada mudará. Danos causados pelos automóveis.

Será que a crise econômica mundial não é uma boa oportunidade para redirecionar a produção automobilística de veículos mais sustentáveis em lugar de cair no simples assistencialismo para evitar o desemprego? No turbilhão da crise, só se pensa em salvar a indústria automobilística, sem refletir sobre o real significado de despejar quase 3 milhões de carros por ano nas ruas e estradas do Brasil.

Industria automobilística

Não poderíamos converter a indústria automobilística em indústria sustentável de soluções de transporte, diversificada e mais atenta aos impactos decorrentes do excesso de vendas tanto quanto ao uso de recursos naturais nos processos de fabricação como ao uso cotidiano dos automóveis? Uma opção é trocar as 4 rodas a gasolina ou diesel por 2 rodas movidas a pedal ou eletricidade para reduzir o número de automóveis nas ruas; para reduzir a emissão de poluentes; reduzir a contribuição individual para o aquecimento global da atmosfera e também reduzir o número de assentos ociosos nos veículos.

Reciclagem

Já na reciclagem existem numerosas iniciativas dignas de nota, tanto no aproveitamento de materiais recicláveis na produção de peças e acessórios para os novos carros, como na reciclagem de peças e acessórios de carros usados para fabricação de novos produtos. Para citar um exemplo, temos bancos e consoles de automóveis feitos com a fibra da casca de coco, considerada um resíduo persistente no ambiente, embora orgânico.

Reciclagem de pneus

Também é importante a transformação de pneus usados em solados de calçados, tapetes, placas de isolamento acústico e térmico e materiais para jardinagem. O índice de reciclagem de materiais oriundos de outros setores na indústria automotiva É, de modo geral, mais alto do que as taxas de reciclagem de materiais originalmente destinados aos carros. Tome-se o próprio caso dos pneus: apenas 35% dos pneus em circulação chegam a algum tipo de reciclagem, isso por que, na maioria das vezes, o consumidor não entrega o pneu usado nos postos de coleta.

Reciclagem de Vidros

Se pensarmos nos vidros de parabrisas quebrados, o índice de reciclagem é vergonhoso. O vidro é um material nobre, quase indestrutível quando dispensado na natureza E cuja fabricação demanda muita energia. A reciclagem, portanto, é altamente recomendável. Os vidros de embalagens jogados no lixo precisam de vários banhos para se retirar toda a sujeita e, mesmo assim, a reciclagem ainda compensa. Já o vidro automotivo está praticamente limpo e, no entanto, a reciclagem nem chega a 5%, segundo o Instituto Autoglass Socioambiental de Educação (IASE).

Abaixo o mito do status
Precisamos despir os automóveis dos milhares de símbolos e mitos com os quais os revestimos durante tantos anos para voltar a enxergar o serviço que ele nos presta, um serviço de locomoção. Não se trata de eliminar de nossas vidas o design, a tecnologia ou o status associado aos veículos particulares, mas redefinir sua função social e, a partir daí, identificar os possíveis substitutos capazes de nos prestar os mesmos serviços de locomoção, com conforto, beleza e também com mais sustentabilidade e menos impactos ambientais.
Leia a seguir a entrevista com Nathalie Ballan, sócia-fundadora da Consultora Sair de Casa: “A comunicação deveria fazer parte da estratégia de sustentabilidade das empresas” feita por Ana Rita Faria em 16.08.2009, no Site Público, em que revela as conclusões de um estudo sobre comunicação responsável.
Com a sustentabilidade na ordem do dia, as empresas continuam a esquecer-se deste elemento fundamental.Para elaborar este estudo, pegou em vários anúncios publicitários e estudou os critérios de várias entidades, como a European Advertising Standards Alliance e o Código da Câmara de Comércio Internacional. E concluiu que, apesar de haver já bons exemplos, muitas empresas ainda não perceberam que uma comunicação comprometida com a sustentabilidade é uma oportunidade de se diferenciarem e terem um impacto na mudança de atitudes dos consumidores.
O que é que significa uma empresa ter uma comunicação responsável?
Hoje, em Portugal e no mundo inteiro, as empresas assumem cada vez mais publicamente um compromisso com a sustentabilidade. Mas, embora comece já a ser claro quais as implicações que a sustentabilidade tem ao nível dos recursos humanos, das práticas ambientais das empresas e da própria inovação, não é óbvio qual a implicação que esse compromisso tem nas práticas da comunicação.
A comunicação responsável é pensada na perspectiva do compromisso com a sustentabilidade, tendo em vista mudar comportamentos e educar as pessoas.Mas a maioria das empresas já faz uma comunicação responsável?
Acho que ninguém tem práticas de comunicação pouco responsáveis de forma deliberada. As tácticas menos responsáveis acontecem geralmente por gafe, ignorância, acidente, por envolver temáticas complexas e com terminologias específicas. Contudo, a comunicação e publicidade tem sempre mais tendência para adular e fazer promessas, pelo que pedir que seja responsável é, por vezes, paradoxal.
Que exemplos encontrou de comunicação irresponsável?
No estudo, fomos buscar exemplos sobretudo à França e Reino Unido. Muitos são anúncios e campanhas que foram retirados pelos próprios organismos de auto-regulação, outras que foram denunciadas por organizações não-governamentais. Um dos temas mais críticos é a imagem da mulher. Em França, em 2006 e 2007, houve uma moda do “soft porn”, em que as marcas usavam quase imagens pornográficas da mulher e a tratavam como um objecto. Além disso, há tendências naturais do tom publicitário, como o exagero ou o humor, que podem levar facilmente a pisar o risco. É o caso de frases do tipo “alugamos carros até às mulheres” ou “seguramos carros, mesmo o da sua mulher”. Outro tema quente é o do ambiente, de onde vêm a maioria dos maus exemplos actuais.
Quais, por exemplo?
Publicitar um carro mostrando-o a circular no meio de uma floresta ou na praia acaba por mostrar um comportamento irresponsável, que é contrário à preservação do ambiente. O mesmo acontece quando um fabricante automóvel associa a sua marca ao slogan “concebido no país dos acordos de Quioto” para dar a ideia de que é um veículo “amigo do ambiente”, outra expressão que não tem qualquer significado e é usada vezes sem conta. De igual modo, uma comunicação responsável implica deixar de fora as afirmações “carbono zero”, que cientificamente não são válidas.
Acredita que os consumidores já determinam as suas escolhas em função da sustentabilidade?Vários estudos mostram que a maioria das pessoas está preocupada com o impacto ambiental e com a sustentabilidade mas, no momento da compra, essa posição não se transforma em comportamento. Há vários motivos a explicar isto: o hábito de comprar sempre a mesma marca, a conveniência, o preço, que pode ser mais alto...
Mas se ainda não há uma percepção dos consumidores que motiva a mudança, como se consegue convencer as empresas a seguir este comportamento?
Não é fácil e, por isso, é extremamente louvável as empresas que o fazem. Contudo, a verdade é que, mesmo sem conquistarem logo o consumidor, as empresas estão a mudar de atitudes, por uma questão de gestão de risco, por uma questão de durabilidade do seu negócio, para continuarem a ter licença para operar e também por uma questão de acreditar e querer contribuir para o desenvolvimento sustentável. A sustentabilidade está hoje, aliás, cotada em índices bolsistas. Parece-me inevitável que as empresas que não sigam este caminho venham a ter problemas.
Sendo assim, a comunicação responsável é uma tendência natural a seguir-se?
Não é tão natural assim. Se olharmos para o Global Reporting Initiative, um standard para fazer prestação de contas e relatórios de sustentabilidade, vemos que não há quase indicadores relativos à comunicação. Parece que se esqueceram que a comunicação tem um impacto na mudança de mentalidades e atitudes. A comunicação devia fazer parte da estratégia de sustentabilidade das empresas ou ser revista à luz desta, por uma questão de coerência. Quando o discurso de sustentabilidade de uma empresa tem visibilidade nos media e a comunicação do grupo não é coerente com isso, é chocante e pode descredibilizar uma empresa que até tem práticas internas óptimas.
Há casos em que tenha reparado nessa incoerência?
Sim. Há, por exemplo, o caso da France Telecom, uma empresa envolvida em sustentabilidade que foi fortemente criticada por várias organizações não governamentais. Tudo por causa de um anúncio a publicitar um serviço de telemóvel que conseguia apagar as luzes de casa, mesmo estando longe do espaço doméstico. O argumento usado é que, com este serviço, se estava a proteger a camada de ozono, o que é um erro científico, porque o consumo de electricidade não tem nada a ver com isso. Uma empresa que tem uma estratégia de sustentabilidade e preocupações ambientais acaba por perder a cara quando faz uma coisa destas. Mas há também casos interessantes, em que as empresas têm uma visão proactiva.
Proactiva em que sentido?
Uma cadeia de grande distribuição francesa, por exemplo, tem sempre anúncios a apelar a hábitos de consumo saudáveis. A sua sede tem um placard que mostra quanto a empresa poupa diariamente em emissões de dióxido de carbono. Tem uma política de partilha de carros, em que a própria viatura é um instrumento para publicitar o car-sharing. Empresas como a Body Shop, a Ben & Jerry e a Starbucks também seguem uma política de comunicação responsável e ganham consistência e visibilidade com isso, além de promoverem comportamentos mais sustentáveis. É verdade que é preciso ter algum cuidado em algumas temáticas e com o vocabulário usado, mas acho que as regras nunca impediram as pessoas de serem criativas.

Cristina Baddini Lucas

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